domingo, 28 de janeiro de 2007

Saber ouvir

Tão importante quanto saber falar, é saber ouvir. Muitas vezes somos traídos pela tendência de falar sem pensar. Podemos dizer que saber ouvir caminha ao lado de saber falar; sugiro agora uma pequena reflexão: quantas vezes respondemos antes que nosso interlocutor tenha concluído seu pensamento?

Quantas vezes começamos a ficar impaciente enquanto o outro procura fazer-se entender?

Quantas vezes apressamos, monopolizamos paralisamos os que tentam exprimir seus pensamentos, com a nossa expressão facial de desaprovação, invalidação, menosprezo e desqualificação?

Quantas vezes já fizemos com que o outro parasse de falar, por sentir que não adianta tentar completar seu pensamento?

Baseado nessa reflexão como estão suas relações interpessoais?

Saber ouvir exige que façamos opção consciente em apreender o que se passa com o outro, de forma solidária e sem preconceitos, com o objetivo de buscarmos o entendimento.

O diálogo nem sempre é uma tarefa fácil, pois envolve a disponibilidade para aprender novas idéias, quando antes gostaríamos de ensinar; humildade para reconhecer que não somos perfeitos e que não sabemos tudo a respeito de todos os assuntos e admitir a coerência de fundamentos e idéias que não são nossos.

Ouvir é muito diferente do ato de escutar. Escutar é o uso puro e simples do sentido da audição e só não escuta quem é surdo. Ouvir vai além do simples ato de escutar, é uma ação mais profunda pois nos envolve por inteiro e é um processo ativo, ao contrário do que muita gente imagina.

É também, a mais extraordinária das artes a ser dominada pelo homem. ouvir é renunciar! Vivemos imersos em cogitações pessoais e é raro conseguirmos passar algum tempo sem pensar em nós mesmos. Talvez por essa razão a maioria das pessoas ouça tão mal, ou simplesmente não ouça.

Sugiro alguns pontos que podem lhe ajudar a ser um melhor ouvinte:

-Fale menos, pois você não pode ouvir enquanto estiver falando.
-Deixe o outro terminar suas frases sem interrompê-lo.
-Ouça sem ficar contra-argumentando internamente, isto dificulta a sua compreensão.
-Acalme a sua mente! Não discuta mentalmente enquanto ouve!
-Controle suas emoções, pois elas podem constituir sérias barreiras à comunicação eficaz.
-Coloque-se no lugar do outro para poder compreender o que ele está dizendo.
-Pergunte quando não entender, quando sentir que precisa de mais esclarecimentos; e também quando desejar mostrar que está escutando.
-Reaja às idéias e não à pessoa.
-Discordância não é sinônimo de rejeição.
-Evite julgamentos precipitados, espere até que todos os fatos sejam colocados antes de fazer qualquer julgamento. Quando os fatos colocados o abalarem emocionalmente, diga que vai esperar algum tempo antes de responder, aproveite esse tempo para refletir e só depois responder. Quando compreendemos o outro, muitas vezes passamos a nos compreender melhor.
-Olhe nos olhos enquanto conversa e encoraje o outro a continuar falando.
-Não converse assistindo à televisão ou lendo um jornal, alem de falta de respeito e de educação, desestimula o diálogo e impele o outro a buscar outras pessoas para falar (até mesmo sobre você).

Saber ouvir leva tempo, prática e paciência. É uma arte que mantêm vivos o respeito, a afeição, a amizade, o sentimento de confiança que o outro deposita em nós. Faz com que nossos clientes, colegas de trabalho, filhos, cônjuges e namorados, sintam-se como pessoas importantes e amigos privilegiados.

Assuma, hoje mesmo, um compromisso de falar menos e ouvir melhor.

sexta-feira, 26 de janeiro de 2007

O barco

Um homem está curtindo a madrugada em um barco num rio. Ele vê outro barco chegando em sua direção. A princípio, parece tão bom que mais alguém também está apreciando o rio em uma noite de verão. Então ele percebe que o barco está vindo exatamente na sua direção, cada vez mais rápido. Ele começa a ficar perturbado e passa a gritar: “Ei, cuidado! Pelo amor de Deus, vire pro lado!”. Mas o barco apenas acelera mais, bem em sua direção. A essa altura ele está em pé no barco, gritando e balançando os punhos. E o barco estraçalha tudo bem em cima dele. Ele ainda consegue ver que era um barco vazio.

segunda-feira, 22 de janeiro de 2007

Universalismo

Por meio da transparência da minha meditação mais profunda, sentirei a luz do Pai permeando todo o meu ser. Serei um filho de Deus, como Jesus o foi, sentindo-O plenamente através da minha consciência expandida pela meditação. Seguirei os pastores da fé, da devoção e da meditação, que me guiarão através da estrela de sabedoria interior até o Cristo onipresente.

Nos homens superficiais, o peixe dos pequeninos pensamentos provoca imenso tumulto. Nas mentes oceânicas, as baleias da inspiração mal encrespam a superfície.

Não graceje o tempo todo com os outros. Seja feliz e jovial por dentro. Por que dissipar em conversa inútil as percepções que você ganhou? Palavras são como balas: quando você gasta sua força em conversas frívolas, seu estoque de munição interna é desperdiçado. Sua consciência é como um balde de leite: quando você a enche com a paz da meditação, deve mantê-la assim. Gracejos geralmente são falsas diversões que perfuram buracos nas laterais do seu balde e fazem com que todo o leite de sua paz seja derramado.

O lugar mais amado por Deus é o templo interior de silêncio e paz de Seus devotos. Sempre que você entrar aqui, neste lindo templo, deixe a inquietude e as preocupações para trás. Se não se despojar delas, Deus não poderá vir a você.

O que toda religião deveria dar a seus seguidores é a percepção da Verdade, a experiência de Deus – e não meros dogmas.

A unidade das várias religiões só poderá se concretizar quando seus praticantes tornarem-se realmente conscientes de Deus dentro de si mesmos. Teremos, então, uma verdadeira fraternidade de homens sob a Paternidade de Deus.

Não é pela concentração em dogmas que poderemos alcançar Deus, e sim pelo verdadeiro conhecimento da alma… Para mim, não existem judeus, cristãos ou hindus; todos são meus irmãos. Eu presto adoração em qualquer templo, pois todos foram construídos em honra de meu Pai.

A verdadeira prática da religião consiste em sentar-se quieto, em meditação, e conversar com Deus… A maioria dos freqüentadores de igrejas não consegue ficar sentada quieta por uma hora, a não ser que alguma atividade esteja ocorrendo o tempo todo, para distrair suas mentes.

Não há forma de serviço maior que falar de Deus. Se você convencer alguém de que o caminho do erro leva ao vale da morte e que o caminho da meditação, à vida eterna, terá dado algo mais valioso do que um milhão de dólares. O dinheiro é perecível, mas a realização divina nos acompanhará além dos portais do túmulo.

As pessoas mundanas buscam as dádivas de Deus, mas o sábio busca o próprio Doador.

Abre-se a eternidade abaixo, acima, à direita, à esquerda, à frente, por detrás, dentro e fora de mim. Com os olhos abertos me contemplo como um corpo pequeno. Porém, se fecho os olhos, percebo-me como o centro cósmico ao redor do qual giram a esfera da eternidade, a esfera da bem-aventurança e a esfera do onipotente, onisciente e vivente espaço.

Paramahansa Yogananda

segunda-feira, 15 de janeiro de 2007

Compadecida

Cumpriu sua sentença e encontrou-se com o único mal irremediável, aquilo que é a marca de nosso estranho destino sobre a terra, aquele fato sem explicação que iguala tudo o que é vivo num só rebanho de condenados, porque tudo o que é vivo morre.


Ariano Suassuna

Sobre a dor

E uma mulher falou e disse, Fala-nos da Dor.
E ele respondeu:
A vossa dor é o quebrar da concha que envolve a vossa compreensão.
Assim como o caroço da fruta tem de fender-se para que o seu coração fique exposto ao sol, também vós deveis conhecer a dor.
E se conseguisseis maravilhar-vos com os milagres diários da vossa vida, a vossa dor não vos pareceria menos intensa do que a vossa alegria;
E aceitarieis as estações do vosso coração, tal como haveis aceito as estações que passam sobre o vossos campos.
E passarieis com serenidade os invernos das vossas mágoas. Muita da vossa dor é escolhida por vós.
É a poção amarga com a qual o médico dentro de vós cura o vosso interior doente.
Por isso confiai no médico e bebei o seu remédio em silêncio e tranquilidade:
Pois a sua mão, embora dura e pesada, é guiada pela mão terna do Invisível,
E o cálice que ele vos dá, embora possa queimar os vossos lábios, foi feito com o gesso que o Oleiro humedeceu com as Suas lágrimas sagradas.

O Profeta
Gibran Kalil Gibran

domingo, 14 de janeiro de 2007

Liberação

Como é possível para um homem liberar outro do apego do Mundo?
Só Deus, o Criador deste mundo de Maya, pode salvar um homem de Maya.
Não há outro refúgio que não seja o grande professor Sat Chit Ananda
(existência-sabedoria-felicidade absolutas).
Como é possível para os homens que não realizaram Deus ou receberam Seu
comando, e que não estão fortalecidos com a força divina, salvar outros
desta casa-prisão que é o mundo?

Sri Ramakrishna

sexta-feira, 12 de janeiro de 2007

Lobos e cordeiros

Morará o lobo com o cordeiro,
E o leopardo com o cabrito se deitará;
E o bezerro, e o leão novo e o animal cevado viverão juntos;
E um menino pequeno os conduzirá.
A vaca e a ursa pastarão juntas,
E as suas crias juntas se deitarão;
E o leão comerá palha como o boi.
A criança de peito brincará sobre a toca da áspide,
E a desmamada meterá a sua mão na cova do basilisco.
Não se fará mal nem dano algum em todo o meu santo monte;
Porque a terra se encherá do conhecimento do Senhor,
Como as águas cobrem o mar.

Isaías 11: 6-9

sexta-feira, 5 de janeiro de 2007

Interexistência

Quando examinamos o coração de uma flor, vemos nele as nuvens, a luz do sol, os minerais, o tempo, a terra e todas as outras coisas que existem no universo. Sem as nuvens não poderia haver chuva, e não existiria nenhuma flor. Sem o tempo a flor não poderia desabrochar. Com efeito, a flor é totalmente formada por elementos que lhe são extrínsecos; ela não possui uma existência independente e individual. Ela “interexiste” com todas as outras coisas do universo.

A interexistência é um novo termo, mas estou certo de que em breve ele estará nos dicionários por se tratar de uma palavra extremamente importante. Quando percebemos a natureza da interexistência, as barreiras entre nós e os outros se dissolvem, e a paz, o amor e o entendimento tornam-se possíveis. Onde quer que existe o entendimento, nasce a compaixão.

Thich Nhat Hanh, em “Vivendo Buda, Vivendo Cristo”

quarta-feira, 3 de janeiro de 2007

Infinito

O Homem sonhava, e em seu sonho havia outro homem que caminhava, com o rosto que Ele teria, se não O tivesse. Era um sonho em forma de caminho comprido, um oito deitado sub specie aeternitatis, que o homem percorria vezes e vezes sem conta, mal se lembrando do Homem que era. E ele tropeçava, caía, se arrastava, morria, levantava-se, continuava, arrastava-se, caminhava. Encontrou outros homens e mulheres, todos que não sabiam como ele, e eram o Homem sem forma e sem rosto, sem nome e sem voz. Alguns deles tinham teorias que diziam que a cada vez que caía e se levantava, a pessoa tornava-se mais sábia, até o dia em que não precisasse mais cair e se levantar. O homem ouvia aquilo tudo e fazia que sim com a cabeça, mas no íntimo não lhe parecia estar ficando mais sábio, a não ser que se chamasse de sabedoria as cicatrizes de escoriações nos joelhos. No entanto, em deferência a seus amigos que assim diziam, decidiu prestar mais atenção no caminho, pois talvez todos aprendessem o que ele não aprendia. Com isso, começou a perceber algo para o qual nem seu agnosticismo nem as crenças de seus amigos o haviam preparado: o caminho repetia-se, repetia-se e repetia-se. Aos poucos, foi desenhando um mapa mental do percurso, e percebeu que limitava-se a andar em círculos fechados. Notando as bordas do oito deitado, delas se aproximou. Faziam fronteira com um insondável Abismo sem forma e sem rosto, sem nome e sem voz. Hesitou um pouco antes de saltar. Então, o Homem acordou e foi tratar da vida.

O Franco Atirador